terça-feira, 20 de dezembro de 2011

reflexão deste tempo de Advento (1)

Penso que não poderia ser mais sugestiva a pergunta a encabeçar a caixa do CD com o filme Derrida (o segundo e último que o filósofo aceitou que lhe fizessem): 
«What if someone came along who changed not the way you think about everything, but everything about the way you think?» 
A metáfora de Paul de Man parece-me extremamente elucidativa do que está em causa: a luz tanto revela como esconde, bastando arredá-la um pouco para se ver o que antes não se via, ou porque ficava ou na sombra ou nas margens, ou porque se escondia atrás dela, da própria luz. Isto leva, em última análise, a perguntar: e como ver a própria luz? Parece óbvio que não se vê a luz com outra luz, antes com a escuridão. Mas aqui pode acontecer fazer sentido o epigrama de Silesius (que parafraseio): se ficas cego por olhar o sol, culpa os teus olhos, não a luz.
Talvez seja inerente ao modo de pensar da mulher varrer com o olhar todo o espaço em volta, como um radar, em vez de focar, como um telescópio, este ou aquele ponto no céu, ou, como um microscópio, este ou aquele ponto sob a objectiva da lente. Pergunto-me como seria o pensamento se tivesse sido desenvolvido a partir do modo feminino de pensar, mas faço-o por pura especulação. Não teria sido desejável, as coisas estão bem como estão. Afinal Derrida precisava que as coisas estivessem como estão para as revolucionar. Quer-me parecer que não lhe terá, mesmo assim, sido prestada a devida atenção, ou que terá sido por isto mesmo que alguns lhe pretenderam negar a "categoria" de filósofo.

Há tempos encontrei, entre os papéis acumulados no sótão, um ponto de filosofia do meu tempo do liceu. Curiosamente não encontrei mais nenhum. Nem tão pouco me lembro de o ter guardado ou de o ter guardado a minha mãe (já que estava com papéis que ela quis deitar fora e que eu trouxe para ali e ali ficaram). Falo disto porque era precisamente o que me ficou na memória por me ter merecido palavras muito duras da professora, escritas à margem. Algo assim: é muito infantil ou não sabe mesmo o que vai pelo mundo? Isto porque, dando-me a possibilidade de dizer qual das posições face à realidade apresentadas eu preferia, escolhi a de Leibniz: tudo acontece da melhor maneira no melhor dos mundos possíveis. Pois se já então achava que sempre um maior bem acabava sempre por, com o tempo, se revelar. Lembro-me de sentir não ter "armas" para discutir, contentando-me em achar que era ela que não alcançava o pensamento de Leibniz. Mas o incidente marcou-me para a vida. Precisava de conhecer Derrida para lhe poder ter dito que, se arredasse um pouco a luz a que olhava, seria também capaz de ver, não o que Leibniz via, mas o que me davam a ver as suas palavras.
Precisava de percorrer um longo caminho para fazer uma aprendizagem em que, a todo o momento, vejo estar longe de satisfatória a nota obtida . Ando como que munida de uma joeira: de tudo guardo o que me parece bom (e, como tal, verdadeiro e belo aos meus olhos) e sopro fora o resto. Ou não tivesse sido isto mesmo que Ele fez (pois se  n' Ele se unem os modos de pensar masculino e feminino na mais perfeita harmonia), inclusivamente no que toca a antiga Lei (o Antigo Testamento).
Tento segui-Lo no que toca a vida, mas faço-o desastradamente e muitas vezes  com a palha deixo ir também o grão. E então tenho de repetir o processo, repetência que, nunca sendo do mesmo, se revela sempre reiteração.