sábado, 4 de dezembro de 2010

A questão das imagens (1)

Há textos que nos sobressaltam e marcam para toda a vida. O impacto deste, de Max Frisch, data dos tempos da Faculdade (o excelente professor de Língua Alemã, Hans Schemann, soube dar-lhe especial destaque entre os da antologia). O texto intitula-se «Du sollst dir kein Bildnis machen» e glosa o versículo bíblico - Exodus: 20,4 - com enfoque no "outro" à semelhança de quem nos deveríamos abster de fazer imagens.

Aprendi com o tempo que as imagens que construímos do "outro" (o processo é, naturalmente recíproco) funcionam como redes que só deixam passar os "traços" que as consolidam, até que, à maneira dos paradigmas científicos, se esboroam e desfazem quando a multiplicação das «anomalias» os abala e faz entrar em crise. Isto explicaria tanto o ardor inicial como o desencanto final da relação amorosa e o papel conferido pelos românticos à morte na sua preservação. A corroborá-lo temos toda a literatura novelesca.

Que peso não terá tido este texto de Frisch (e toda a literatura que sustentou todo o meu imaginário de então) no relacionamento que iniciara (teria dezoito anos) e que, tant bien que mal,  haveria de se sustentar por toda a vida? Ironicamente vejo advir todos os problemas com que me confronto hoje das imagens que me afivelaram ao rosto e me fazem sentir, neste espaço em que me movo, como uma espécie de "prisioneiro da máscara de ferro". Não vêem que eu não sou como me vêem? Esta pergunta é um grito sufocado em mim, aceite que foi por mim, desde há muito, encarar a situação (bem como o inerente isolamento a que me vejo votada num espaço na construção do qual, para todos os efeitos, tive um papel) como intrínseco ao percurso de aprendizagem que me pertence levar até ao fim.