sábado, 20 de novembro de 2010

prosseguir?

O perigo de «fazer juízos" tem uma dupla face: posso procurar não fazer juízos do outro, mas não posso evitar que o outro os faça de mim. Na consciência disto mesmo, um perigo me ameaça e perturba, que é o de me preocupar com os juízos que o outro possa fazer de mim («Que se te dá os outros?», diz-me essa outra parte de mim que se assume meu guia). E não só esses juízos me preocupam como eu própria lhes dou forma. Chego mesmo a admitir, esgotadas outras possibilidades, a intromissão do mal na forma daqueles seres da sombra, almas feias, sujas e perversas, que contaminam o mundo e parecem ter encontrado na net um habitat favorável. Com Traherne, acredito que existem para que, no contraste, mais resplandeça a beleza feita de luz daqueles em quem a vejo e por isso mesmo «privilegio».

Mesmo acreditando que esses em quem tal beleza brilha permanecem, por isso mesmo, incólumes a tal forma de mal, afligem-me as hipóteses que levanto para explicar o seu afastamento ou  a sua ausência: terei dito ou sugerido, sem o querer, alguma coisa susceptível de ser julgada e considerada condenável?

O «outro privilegiado» é-o no serem consonantes na sua "eleição" as duas partes de mim, unidas na expectativa da irrupção desse "terceiro" salvífico que (quantas vezes o já disse? di-lo-ei mais uma vez...) intervindo como tal na tríade que sustenta, é também e misteriosamente quem a gera. Ambição desmedida a tocar a temeridade? Não bastava Ele? Porquê o mundo? Porquê o outro nesse mundo? Porquê, quando pensei ter chegado ao fim da viagem, me vi numa nova estrada, antes insonhada, a abrir-se diante de mim no escuro? Algo mais do que essa outra parte de mim que me guia, me fez /faz prosseguir. Insondáveis são, porém, os Seus caminhos. Apenas sabemos que a Ele conduzem.