quarta-feira, 19 de maio de 2010

A "relação especial"

É a natureza, banal ou especial, da relação com o "outro", na vida como na escrita, que determina a natureza dos participantes envolvidos; no entanto, é esta sua natureza que determina a da relação. A relação banal faz deles "sujeitos" que um do outro se fazem objecto: mesmo na vida há lugar ao "par" constituído por sujeito enunciador e sujeito-enunciatário.
A relação especial, em contrapartida, sustenta o "eu" em cada um, o que só é possível mediante a intervenção de um "terceiro", instaurador da natureza especial da relação de que irrompe. Nesta dinâmica assenta o mistério da trindade, um mistério que no revelar-se se mantém oculto (sendo precisamente isto que faz a distinção entre mistério e enigma). A natureza da relação especial assim criada será santa se, pelo Espírito Santo, se constituir à imagem da trindade divina (Jesus dá-a a ver como relação entre Pai e Filho, um pai a quem o filho se dirige de um modo muito íntimo - Abba; o Cântico dos Cânticos simboliza-a na relação de amor erótico entre homem e mulher; o segundo Génesis induz o seu pressentimento no misterioso versículo "e fê-los Deus homem e mulher à Sua imagem").
Mas será a relação especial sempre necessariamente santa? Diria que a relação especial, no sentido de não banal, propicia o mútuo aperfeiçoamento que não é possível sem a intervenção do "terceiro", santificador. O "discernimento dos espíritos", esse misterioso dom do Espírito Santo será aqui crucial.