segunda-feira, 9 de agosto de 2010

reflexões caóticas

Os dias têm-se sucedido numa ordem de reflexão demasiado caótica para ter conseguido organizar a partir dela um texto com um mínimo de coerência. Tal a razão deste meu já prolongado silêncio aqui, não obstante o quanto há a dizer e que deixei suspenso.
Se, como refiro no último post, vi confirmada uma intuição profunda que sempre me fez pressentir algo de errado na instituição da família - núcleo centrado em si mesmo, constituindo como tal um alargamento e reforço do ego individual - , voltei a colocar a questão nunca resolvida do que é «libertar-se de si» «perder-se de si». Sempre o quis entender como um meio para um fim: perder-se de si para O encontrar, e, encontrando-O, encontrar-se, num retorno sem retrocesso que me fez sempre ver na via mystica no Ocidente um passo além daquele por que se deixa ficar o misticismo oriental (chamemos-lhe assim). Como se o caminho se abrisse, outro, na outra margem insonhada. Algo mais face ao qual a perda de si mesmo no seio do divino representada na velha metáfora da gota de água que cai no mar (ou mesmo da «particulazinha da criação», como se vê Santo Agostinho, que vive inquieta enquanto não repousar n' Ele) constituísse um meio para um fim.

Mas não estarei eu a justificar-me perante mim mesma do que, de outra forma, representa um erro com sequelas graves que nunca soube enfrentar senão contornar? Posso, como Traherne, deitar as culpas aos «costumes dos homens», a uma organização da sociedade em que a instituição "família" representava a maior segurança, se não em termos económicos (na altura já tinha as condições para assegurar a minha própria subsistência), certamente em termos sociais. Aos vinte anos afigurou-se-me uma plataforma estável de onde a qualquer momento poderia empreender o ansiado voo no divino, com muito mais liberdade do que se optasse pela vida religiosa instituída (a que era, pelo que dela sabia, inteiramente avessa). É já proverbial o «cuidado com o que pedis nas vossas orações porque podem ser atendidas». E assim foi... Pedi e fui atendida.
Quando o "espirit(ual)ismo" diz que temos um papel na nossa vinda ao mundo (ao arrepio do «não fui consultado no acto de que nasci»), sinto-me tentada a dar-lhe razão. Mas mais não é do que isso mesmo: mais uma tentativa de decifrar o que não é decifrável não se tratando de um enigma, mas de um mistério. Os "fenómenos", porém, persistem para além de todas as explicações que se lhes procure dar. E nunca poderei negar o "fenómeno" que me fez dar sem hesitação o passo mais decisivo que jamais voltaria a dar na vida. Cedo demais? Sem dúvida. Mas só muito cedo é que se dão passos destes sem hesitações.
Não digo ter sido um erro uma vez que o caminho teria sido outro se outro tivesse sido o passo e o que o caminho me tem revelado dá a tudo a sua razão de ser. Tudo se concatena.
Porquê esta impaciência? Porquê este constante antecipar mental do que possa vir com o inerente medo de o perder pelo que fizer ou não fizer nesse sentido? A experiência diz-me que o que vem se revela sempre para um muito maior bem em termos de avanço numa nova claridade do que o que antecipei, quase sempre ao encontro de desejos do eu superficial e dos seus projectos egocêntricos de felicidade. Não sei eu que os devo abandonar?

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