terça-feira, 27 de julho de 2010

«Es war ein König in Thule»

Faz sentido evocar a balada de Goethe que sempre tão profundamente me tocou:





Es war ein König in Thule
Gar treu bis an das Grab,
Dem sterbend seine Buhle
Einen goldnen Becher gab.

Es ging ihm nichts darüber,
Er leert' ihn jeden Schmaus;
Die Augen gingen ihm über,
Sooft er trank daraus.

Und als er kam zu sterben,
Zählt' er seine Städt' im Reich,
Gönnt' alles seinem Erben,
Den Becher nicht zugleich.

Er saß beim Königsmahle,
Die Ritter um ihn her,
Auf hohem Vätersaale,
Dort auf dem Schloß am Meer.

Dort stand der alte Zecher,
Trank letzte Lebensglut,
Und warf den heil'gen Becher
Hinunter in die Flut.

Er sah ihn stürzen, trinken
Und sinken tief in's Meer.
Die Augen täten ihm sinken;
Trank nie einen Tropfen mehr.


Tradução de Paulo Quintela (contra o habitual nele, demasiado livre para o meu gosto...):

Houve em Thule um rei, fiel
Até que a morte o levou;
A sua amada, ao morrer,
Taça de oiro lhe deixou.

Nada amava ele mais na vida;
Consigo sempre a trazia;
Os olhos se lhe toldavam
Sempre que dela bebia.

As cidades do seu reino
Contou, ao chegar-se a morte.
Tudo - só a taça não! -
Deixou ao herdeiro em sorte.

Com seus cavaleiros foi-se
El-rei à mesa assentar,
No salão de seus avós
Do castelo à beira-mar.

O rei velhinho bebeu
Ardor último da vida,
E atirou a taça santa
Pra a água, por despedida.

Viu-a cair, e no mar
se embebeu e mergulhou.
Embaciou-se o olhar...
Nunca mais vinho provou.
-
J. W. Goethe, Poemas,
Coimbra, Centelha, 1986, 4.ª ed., versão de Paulo Quintela