domingo, 7 de junho de 2009

"Midwinter spring is its own season"

Leio mais uma vez o poema e (como acontece, aliás, com todos os "poemas do viandante") saboreio-o "na mais terna alegria" - aproprio-me destas suas palavras em que vejo desdobrar-se (no sentido em que D. Bohm faz uso de "unfold") o significado mais antigo de "enjoy". Sim, a alegria em que Ele Se compartilha, em nós fora de nós e connosco, na dinâmica trina em que tudo isto acontece. E o que é "isto"?

Trouxe ontem de Lisboa os quatro CDs de Tristan und Isolda (o meu pai tinha uma predilecção muito especial por Wagner, de que nunca cheguei a entender a razão profunda). Ansiava por ter uns momentos meus para, depois de eliminar todos os ruídos associados, de fora, ao homem que fez "isto", escutar, no maior silêncio, "isto" que ele fez. Conduzida pelo viandante, escutei, uma vez mais, mas numa outra forma, a "voz deste chamamento" na "atracção deste Amor"( "the drawing of this Love and the Voice of this Calling").
Muitas vezes contemplei o horizonte que me abria Traherne com as palavras "GOD never shewd Himself more a GOD, then when He appeared Man". Mais longe neste mistério da "dor de Deus" me levam agora estas palavras suas, que mo trazem à consciência, imersa na beleza radical destes acordes: "a dor de Deus feita música, uma dor que chama por nós na noite negra, uma dor que abre o mundo à terna alegria".
Quando pergunta "como é possível que um homem tenha feito aquilo? Como na pura imanência se inscreve a absoluta transcendência?", toca o mistério que as teorias da autotelicidade da obra parecem querer ignorar: o mistério de que, inquestionavelmente, um homem fez "isto" e em "isto" ele vive. (E que dizer da soprano?)

Ao dar voz às palavras deste poema, dou-a a quem nele fala e me fala - o Poeta, como Ele, tem este poder de se dar plenamente, a mim (e a cada um) como se fora única - ; mas dou-a ao mesmo tempo a mim mesma, numa enunciação que, na segunda pessoa, lhe/Lhe diz, com o alcance infinito da poesia, que "tudo está preparado".
"Midwinter spring is its own season": assim se inicia o quarto de Quatro Quartetos.
Não é esta "estação" a que é aguardada no poema? Virá e com ela as flores, quando a anunciarem os pássaros "e a névoa do inverno / deixar vir / a luz que nos resta."

Digo-Lhe: não foi da Tua vontade que fosse a Santiago... É então Little Gidding que me pões no horizonte? E dás-me um guia que não deixará que me perca senão em Ti.