domingo, 6 de setembro de 2009

"fons selata"

"Se conhecesses o amor de Deus / tu correrias até o encontrar". São os dois versos do refrão de um cântico que glosa o passo da Samaritana ( Jo, 4:10): "Se conhecesses o dom de Deus...". Se se tiver, ainda que no espaço de um instante, apenas pressentido esse amor, se se tiver provado uma gota apenas da água que Ele dá, ela tornar-se-á, como Ele disse, "uma nascente de água a jorrar para a vida eterna". A água que sacia a sede de infinito... Ainda que o deserto avance e a fonte seque à superfície, nas profundidades "correrão rios de água viva" ("o que embeleza o deserto", disse o Principezinho, "é que ele esconde um poço em qualquer parte".) Ainda que a noite caia e as trevas envolvam a terra, há a certeza de que a luz as romperá em amanhecendo. Fé é uma certeza desta natureza que muda radicalmente uma vida, não é crença nisto ou naquilo. Conhecer o dom de Deus é como ver o sol pela primeira vez : uma vez basta, ainda que o escondam aos olhos as mais carregadas nuvens ou a mais escura das noites.
Diferentes, sem dúvida, são os caminhos, diferentes as distâncias, as paisagens, as circunstâncias, diferentes os passos e o ritmo da marcha, mas a água é a mesma, o mesmo é o dom, o mesmo o amor. Poderei dizer, no modo de leitura que me é propiciado pelos próprios poemas que leio - e falo dos "poemas do viandante" e do momento em que, em mim, reading se torna scrying - que pressinto essa água viva "a jorrar para a vida eterna" e com ela a certeza do dom e do encontro.