Continuo a nova leitura de Cloud of Unknowing, na versão de Underhill, pressupondo que seja próxima da original. Tenho esta convicção de que as palavras originais são por isso mesmo mais propícias ao acontecimento de que nasce a tríade eu-tu-Tu. Foi, na verdade, com a primeira leitura deste livro que tive pela primeira vez a experiência desta tríade, suficientemente intensa para se me tornar perceptível.
Leio-o agora de uma outra forma, reconhecendo que o primeiro "encontro" aconteceu no que, em retrospectiva e pela multiplicidade de experiências desta ordem que então ocorreram, sem porquê, me parece poder encarar como esse grau "especial", de repente instaurado na minha forma "comum" de viver.
Não há retorno. Nem o desejo é nesse sentido, o que me causa estranheza tendo em conta que não conheci na vida momentos de maior felicidade. À transitoriedade do grau "especial" aplicarei as palavras de S. Paulo relativas ao processo de crescimento, no decorrer do qual cedo o leite materno é substituído por alimento sólido. O grau especial é pura graça (a tomada de consciência disto mesmo instaura a maior humildade em face de uma dádiva sem correspondência com qualquer merecimento).
Do grau "singular" nada sei ... apenas posso falar da "longa noite" que se sucedeu à etapa "especial", noite que queria encarar como preparação necessária para o que virá e que inteiramente desconheço. Não entendi de início que iria entrar pela noite dentro e caminhar às escuras. Até aí nunca estivera só. Não me vale de nada tentar convencer-me de que era apenas uma entidade espiritual que partiu para a luz. "Eu sou a luz", dir-me-ia se lho tivesse perguntado então. Parecia-me evidente que o lago estando cheio tinha de transbordar.
Não sei se é inerente a este caminhar que o "outro privilegiado" (aproprio-me de uma designação que me parece feliz, ainda que seja outra a referência envolvida no seu uso original) venha ao meu encontro para se afastar depois, preterindo-me. Atribui-lo a desajustes referenciais (dentro desta denominação meto muita coisa relativa ao "suporte material" do que poderia chamar "vida" se a opusesse a "escrita") faz-me tomar consciência de um despojamento que por me ser penoso não deixa de ser essencial a um avanço que acredito ser "de claridade em claridade": "sair de uma luz para noutra entrar", na reverbalização que Silesius faz das palavras de S. Paulo.
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