domingo, 4 de abril de 2010

tocar a eternidade e não se aperceber disso

À medida que avanço em I am a strange loop vou-me dando conta dos dogmatismos de opinião que condicionam este loop particular que dá pelo nome de Douglas Hofstadter. Não posso senão lamentar todo o tipo de dogmatismo, seja científico seja religioso, que fatalmente constitui uma obstrução, um muro a fechar lá fora o Mistério, tratado dentro como um enigma para que se busca - e encontra (!)- solução. D.H. parece assim fechar-se a si mesmo (e a quem consiga convencer - à quoi bon?) num universo que culmina no "nível" das nossas percepções e dos instrumentos construídos e construíveis para as potenciar (ainda que fosse possível a sua potenciação ad infinitum nunca alcançariam nível algum acima deste...). Hipóteses, como a de um outro "nível" de realidade, são banidas, pela simples razão de não poderem ser validadas ou invalidadas no nível em que esta "ciência" se movimenta.

A imagem do loop agradou-me de início como representação simbólica da consciência que reflecte sobre si mesma, "recapitulando", abrindo os olhos à eternidade que, citando o Viandante, "já está aí", em cada instante vivo.

Que estreita a mente - "small soul", na verdade - a que reduz a eternidade àquilo que, dando-lhe este nome, nega e que, naturalmente, não posso senão negar também, tal sendo. Seria uma destas mentes "esclarecidas "(contadoras da "anedota") a vestir a pele de criança que, face às palavras "quem comer deste pão e beber deste vinho viverá para sempre", protesta como sendo uma grande mentira pois que muitas vezes vira a avó fazê-lo e tinha-a visto morrer. As crianças nascem com uma pré-sensibilidade ao símbolo no que ele comporta de abertura ao Mistério (das Offene chama Rilke ao que está "aberto" e que animais e crianças pequeninas têm diante de si).

D.H.fecha toda a abertura no momento em que reduz o símbolo a mero emblema ou signo, accionador de outros emblemas ou signos, em múltiplos e complexos loops sem saída que não seja nesse nível em que tudo desemboca e culmina. Não dista muito esta crença da de outrora no mundo plano.

Continuo, porém, a ler, na expectativa sempre gratificada de ir deparando com a derrocada dos muros construídos na ânsia de tapar as aberturas que a todo o momento discirno. Assim acontece quando leio Jean-Luc Nancy, sobretudo Noli me tangere em que instantes há em que "toca" a "eternidade" sem se aperceber disso.