«noli me tangere»
Será por tudo isto (e não só) que um livro é para mim um encontro com aquele que o escreveu e, na proporção em que se me revela "especial", um contacto impossível com a transcendência do "outro" cujo mistério tanto me fascina.
Com respeito ao que para ele me atrai como se "química" houvesse, só posso dizer que a mais completa biografia que dele fosse (re)constituída não me daria uma centelha do conhecimento que, sem o alcançar, alcanço assim (perdoe-se-me o oxímoro, um tanto anacrónico). Posso, por isso, inteiramente prescindir do conhecimento dos dados pessoais do autor, e mesmo admitir que tais dados, sempre de superfície, poderiam obstar à relação naquele nível mais elevado de vibração (se é que posso falar assim) que a obra me propicia.
Nesta perspectiva, a biografia do autor (excepção feita à autobiografia, ficcionalizada ou não, que leio como mais um texto seu) parece-me comparável ao que, na vida real, me fosse dito do "outro" ou que viesse indirectamente a saber dele, antes ou depois de havido esse "contacto" (no sentido etimológico do termo), esse «corpo a corpo» com a obra que leio e que, por aquela misteriosa "química" de que falo atrás, se me manifesta especial.
A linguagem da química não é traduzível em linguagem verbal (quando muito a expressaria «em línguas»). Não é uma biografia, ainda que fosse de uma outra natureza, que me propusesse reconstituir a partir de «vestígios» ou «sintomas». O desejo é o de estender a mão como Maria de Magdala para o tocar, para o deter, para lhe dizer "fica um pouco mais". Insondável o mistério a que as tão escrutinadas palavras latinas oferecem um frágil suporte e que poderia convocar aqui. De onde o título deste post.
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