terça-feira, 19 de julho de 2011

a abertura à protagonização

Vergílio Ferreira, num texto a que penso já aqui ter aludido, é o termo «fulgor» ( ou um seu derivado) que usa para a realidade - ou tomada de consciência dela - que lhe suscita a escrita:  «...e descobrimos alucinados esta realidade fulgurante que é a pessoa que somos (...)»
«Alucinados» é o termo que escolhe para um sentir que generaliza a um «nós» em que se inclui. Muito longe me deixa, levando-me talvez mesmo na direcção oposta,  daquele  espanto - Wonder / Wunder - que a mesma tomada de consciência, ou seja, o eu tomando consciência de si mesmo, suscita a T.T. e a A.S., que assim o explicitam:

O wondrous self! O sphere of light!
O sphere of joy most fair!  [...]
Thou which within me art, yet me! Thou eye
And temple of His whole infinity!

Jch bin so breit als GOtt /  nichts ist in aller Welt /
Das mich (o Wunder ding!) in sich umbschloßen hält.

Poderia pensar que todos estes textos põem em foco o mistério do que os ingleses chamam "self", inerente a todo o ser («It intended to be itself. But what self?», pergunta Ursula, a personagem de D.H.Lawrence, relativamente ao ser unicelular que vê ao microscópio), independentemente, portanto, do grau de consciência de si,  o núcleo onde tudo converge e de onde tudo emana, o ponto-centro e a  ilimitada esfera de que T.T. e A.S. se dão conta, maravilhados. 
Se, como Vergílio Ferreira, fazem uso da primeira pessoa a si reportando a experiência vivida, que diferença faz lê-la na terceira pessoa, reportada por um narrador impessoal como tendo lugar numa e para uma personagem? Quando personagem e narrador coincidem, é porventura o texto menos "realista", menos "poético" ? A cena continuaria a apresentar-se ou desenrolar-se diante de nós, seja na interioridade, seja na exterioridade da personagem, continuaria a abrir-se à nossa protagonização. É aqui que entramos, que somos mesmo convidados a entrar como enunciatários pessoais ou impessoais, directos ou oblíquos.